segunda-feira, 29 de junho de 2009

O maior bioma do mundo


Arara Vermelha, na floresta do Instituto Floresta Viva, no Amazonas. Foto: Dida Sampaio/AE


As escamas do peix
e Pirarucu são utilizadas como adereços de roupas e acessórios por estilistas. Foto: Dida Sampaio/AE

Pássaro na reserva de desenvolvimentos sustentável Cujubim Foto: Dida Sampaio/AE


O ribeirinho João Teofolo exibe couro de Onça Pintada caçada por ele na Reserva Cujubim. Foto: Dida Sampaio/AE

Peixe Tracajá, encontrado na beira do Rio Jutaí. Foto: Dida Sampaio/AE

Jacaré do rio Jutaí, na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Cujubim. Foto: Dida Sampaio/AE


Macaco na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Cujubim. Foto: Dida Sampaio/AE

Macaco Uacari vermelho, na floresta do Instituto Floresta Viva, no Amazonas. Foto: Dida Sampaio/AE

Nenhum outro país chega perto do Brasil em número de espécies

MANAUS - O Brasil abriga 13% das espécies da fauna e da flora existentes em todo o mundo – e a maior parte delas está na Amazônia. A floresta de 4,2 milhões de quilômetros quadrados é habitada por centenas de milhares de espécies de plantas, animais, fungos, bactérias. Um refúgio de suas matas ou um braço de seus rios pode conter mais espécies do que continentes inteiros.
A Amazônia brasileira tem 1.200 espécies conhecidas de aves. Só num raio de 150 km de Manaus é possível encontrar 800 delas, mais do que nos Estados Unidos e Canadá juntos (que têm 700). E ocorre o mesmo com os peixes: o número de espécies descritas na Amazônia (mais de 2 mil) é dez vezes maior que o de toda a Europa – apenas 200. Só no Lago Catalão, entre os Rios Negro e Solimões, em frente a Manaus, há 300 espécies conhecidas, segundo os especialistas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).
As estimativas dos cientistas são de que só 10% das espécies existentes na Amazônia brasileira sejam conhecidas. Talvez menos. Ainda assim, na escala amazônica, 10% já englobam números espantosos. Só de anfíbios são 250 espécies catalogadas, ante as 81 da Europa. Os mamíferos são 311, com mais de 70 espécies de macacos e 122 de morcegos. As abelhas são 3 mil; borboletas e lagartas, 1.800. Em uma única árvore da Amazônia já foram encontradas 95 espécies de formigas – 10 a menos do que em toda a Alemanha.
Mas há uma imensidão ainda a ser desbravada. E não é preciso ir longe para encontrar novas espécies: mesmo no Rio Amazonas, o mais explorado da região, as descobertas são rotineiras – em 2005, foi identificado um exemplar de piraíba, que pode chegar as mais de 2 metros. Levantamentos recentes feitos com redes de arrasto revelaram um universo de peixes elétricos e outros animais exóticos que vivem nas regiões mais profundas do rio, em áreas de escuridão total. “Mesmo o que pensamos ser muito conhecido é pouco conhecido. É impressionante”, diz o especialista Jansen Zuanon, do Inpa. A média para o Brasil é de uma nova espécie de peixe de água doce descrita por semana.
No Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém, 70 novas espécies foram descritas nos últimos seis anos, incluindo vespas, aranhas, peixes, macacos, cobras e plantas. “Se tivéssemos mais pesquisadores, certamente descobriríamos muito mais”, diz a diretora do museu, Ima Vieira.
A maior parte da Amazônia ainda é território inexplorado pela ciência. Estima-se que até 70% das coletas feitas sobre biodiversidade na região estão restritas aos entornos de Manaus e Belém – onde estão o Inpa, o Museu Goeldi e as principais universidades da região. Diante do tamanho e da heterogeneidade da Amazônia, é o mesmo que observar a região por um buraco de fechadura. Faltam respostas para perguntas básicas: quantas espécies existem na região? Como elas estão distribuídas? Qual o papel de cada uma na natureza? Ninguém sabe dizer ao certo. A maior biodiversidade do planeta é também a mais desconhecida.
Organismos menores e altamente diversos, como os invertebrados (que constituem 95% das espécies animais do planeta), não têm nem estimativas. “Não chamo isso nem de lacuna; é uma cratera gigantesca de informação”, diz o ecólogo Thomas Lewinsohn, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), coordenador do maior levantamento sobre biodiversidade já feito no Brasil. E completa: “Nem é incapacidade dos cientistas, é um buraco negro mesmo. Não dá nem para chutar números.”
Não se trata apenas de saciar uma curiosidade científica. A falta de informações é uma ameaça direta à conservação da biodiversidade e dos serviços ambientais prestados por ela. “Como é que vamos entender o funcionamento de um ecossistema se nem conhecemos as espécies que fazem parte dele?”, pergunta o zoólogo Miguel Trefaut Rodrigues, da Universidade de São Paulo (USP).
O planejamento de obras e a definição de áreas para conservação, por exemplo, dependem diretamente desse conhecimento. “Produzimos muitas informações sobre a Amazônia, mas elas não estão organizadas de uma forma prática que possa nos dar respostas rápidas para perguntas importantes”, resume José Maria Cardoso da Silva, da ONG Conservação Internacional (CI).
A última Avaliação do Estado do Conhecimento da Biodiversidade Brasileira calculou o número de espécies conhecidas no Brasil entre 168 mil e 212 mil – uma diferença de 44 mil. Prever o número real de espécies (incluindo as desconhecidas) é ainda mais difícil. Lewinsohn estima um total entre 1,4 milhão e 2,4 milhões de espécies. Baseando-se no ritmo atual, com uma média de 700 novas espécies descritas por ano, serão necessários 1.200 anos até que seja conhecida toda a biodiversidade brasileira – incluindo a da Amazônia.
A lista oficial da fauna ameaçada do Brasil inclui 58 espécies da Amazônia – 9% do total. É pouco, se for levado em conta que muitas espécies provavelmente estão ameaçadas ou já foram extintas sem que os cientistas tenham tido chance de conhecê-las. “Certamente já perdemos muito mais do que conseguimos avaliar”, lamenta o ornitólogo Alexandre Aleixo, do Museu Goeldi.

Fonte: Herton Escobar (O Estado de São Paulo)

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